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Valença

Estes dias de antropofagia

26 Setembro, 2012 - 11:20

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Só um desatento, ou um tonto, pensa que é fácil cortar na despesa do Estado. Mas o que este Governo tem feito, tem sido apenas aquilo que na campanha eleitoral dizia que era injusto e contraproducente: aumentar a carga fiscal, ou seja, procurar reduzir o défice apenas pelo aumento da receita feita, através dos trabalhadores.

Só um desatento, ou um tonto, pensa que é fácil cortar na despesa do Estado. Mas o que este Governo tem feito, tem sido apenas aquilo que na campanha eleitoral dizia que era injusto e contraproducente: aumentar a carga fiscal, ou seja, procurar reduzir o défice apenas pelo aumento da receita feita, através dos trabalhadores.

A TSU, ao propor transferir riqueza dos trabalhadores para as empresas, simboliza o desprezo que este Governo tem pelos cidadãos, em particular pelos mais vulneráveis, através da diminuição de descontos de 2,3 mil milhões de euros para as empresas e uma subida dos descontos dos trabalhadores de 2,8 mil milhões de euros. Passos veio apenas dizer aquilo que o seu assessor António Borges pensava, um tecnocrata perfeito que, conjuntamente com Braga de Macedo, pensa que a economia é só números e regras e esquemas teóricos. Economia é o mínino de felicidade que se pode proporcionar a cada oikos, ou cada família. Economia é poder beber vinho e comer carne saborosa, se não for da alcatra pode ser do cachaço, se não for Quinta do Vale do Meão pode ser Porta da Ravessa, mas no fundo todos temos direito a comer e a beber. Todos temos de ter um salário, grande ou pequeno, que tem de garantir um copo de vinho, tenha ele que rótulo tenha. Quem não compreender isto que fique em casa, para evitar aventuras políticas tristes. Mas com certeza fiz um raciocínio elaborado. Tão elaborado, que para um homem como Vítor Gaspar, de tão certinho que é, tudo o que apontei não passa de cultura popular metafísica. Que pena, se bebesse uns copitos facilmente poderia chegar lá.
Os homens da água, ou que apenas bebem dois copos, como medo da vergonha, ou que gostam apenas muito de vinho porque podem com ele ganhar dinheiro, não têm grandes ideias; viveram sempre à sombra do estudo ou vivem de ordenados de milhares de euros para fazerem relatórios para agências financeiras com má reputação. Mas são estes homens que influenciam um Primeiro-ministro que não tem ideias sobre nada. Até sobre a RTP, na célebre entrevista de quinta, para explicar o mal que fez, disse que espera pelos seus Advisers Solutions, grandes conhecedores do mundo audiovisual (para português pobre, os seus mentores: Grande Ângelo Correia e João Duque), para decidir o que fazer. Quando para poupar teria, obviamente, de contratar pessoas de contas, e boas pessoas do ponto de vista profissional. Porque do ponto de vista estratégico, até eu sei o que fazer com a RTP.
Mas não vou por aqui. O que eu quero dizer é que o Passos poderia estar bem preparado. E estar bem preparado não é ficar fascinado pelas ideias dos seus ministros ou conselheiros que desejam tornar o nosso país competitivo com eucaliptos (Cristas), minas (Álvaro) e salários miseráveis (Borges). Até porque o desenvolvimento económico está, frequentemente, mais dependente da mudança de mentalidade do que propriamente de quadros estatísticos. No entanto, o que agora é importante é que os nossos credores têm de receber e com juros. Para eles isso é o mais importante. E é normal que assim seja. Ponto. O dinheiro vale dinheiro, e quem pode precisar pode pedir mas tem de pagar, obviamente. Nem sequer chega a ser uma lei moral é apenas uma lei que merece respeito, até para não cairmos na anomia social.
Mas o que mais espanto suscita é como o nosso Primeiro-ministro fica sempre fascinado com as teorias tontas de gente que acredita que a economia obedece apenas a regras infalíveis e a jogos matemáticos complexos, que seguem o efeito dominó. Isto é que é verdadeiramente preocupante, porque qualquer jornaleiro simples, que não bebe, como o Alexandre Relvas, militante do PSD e empresário de um grande grupo económico português, com presença em todo o mundo, sabe que a TSU até pode ser uma medida pertinente, mas não no actual quadro político, económico e social.
É que com gente intelectualmente superior e com gente que pouco sabe, nada de bom pode advir para os destinos do nosso país. Os primeiros olham para o país como se estivessem a olhar para uma maqueta de cortiça, de certeza que nunca foram a Pinhel como não sabem onde fica, os segundos, para recolherem simpatia dos primeiros e serem aceites como inteligentes, aceitam tudo o que os outros dizem e acreditam em profetas, até ao ponto de proclamarem que se lixem as eleições. Mas aqui até não são muito ousados e podem bem fazê-lo, obviamente, porque, infelizmente, na sociedade portuguesa qualquer pessoa que chegue aos altos quadros da administração, por muitos disparates que tenha feito, encontra sempre, posteriormente, um lugar de repouso.
Como leitura complementar a esta meia dúzia de desabafos que vos deixo, aconselho-vos, assim como ao Vítor Gaspar, a ler: O Cisne Negro, Impacto Altamente Improvável, de Nassim Nicholas Taleb. Se assim fosse talvez o Passos Coelho tivesse evitado estes dias de antropofagia com o país todo no caldeirão, e com divisões no seu partido e na coligação, que ameaçam uma intervenção estrangeira por muitos mais anos. Saber exactamente qual a parte do futuro que pode ser introduzida no presente é o segredo de um bom Governo, e é isso o que Passos não tem sabido fazer.

Vitor Paulo Pereira

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