Foi a última refeição do Papa Clemente VII. Estávamos a 25 de setembro de 1534. O Sumo Pontífice ingeriu Amanita Phalloides [foto de capa], considerada uma das espécies mais perigosas de cogumelos no planeta. E este é apenas um dos casos, possivelmente o mais remoto, que se conhece da incontável lista de vítimas mortais que este cogumelo já provocou.
Os números devem-se sobretudo ao Amanita Phalloides ser facilmente confundido com o Volvariella Volvacea, totalmente inofensivo e muito usado na gastronomia.
Por toda a floresta do Alto Minho já se avistam várias espécies. Entre elas o fatal Amanita Phalloides. De acordo com os especialistas, bastam 50 gramas desta espécie para provocar a morte a um ser humano adulto.
Os sintomas aparecem geralmente 8 a 12 horas após a ingestão, com náusea, vómitos, diarreia severa, febre, taquicardia, hipoglicemia, hipotensão e desequilíbrio dos electrólitos, com distúrbio ácido-base.
Numa segunda fase, 24 a 48 horas após a ingestão, surgem os sintomas gastrintestinais e deterioração das funções hepática e renal. Três a cinco dias depois, ocorre dano hepatocelular e falha renal, que pode evoluir para falha hepática severa em alguns casos. Surgem problemas de cardiomiopatias e coagulopatias.
Nos casos fatais, a morte ocorre em 7 a 10 dias. Normalmente, as vítimas sucumbem por falência hepática.
O falso “frade”
O jornal Público alertou em abril de 2018 para uma espécie de cogumelo silvestre, a Macrolepiota venenata, responsável pela maioria das intoxicações alimentares que ocorrem no Outono e também na Primavera com a ingestão deste tipo de produto silvestre.
José Luís Gravito Henriques, especialista em micologia e autor de diversos artigos e publicações sobre cogumelos, registou vários relatos de casos de intoxicação, “alguns dos quais mortais”, porque as pessoas que apanhavam a espécie tóxica julgavam estar a levar para casa a Macrolepiota procera — conhecida como “frade” — e que é comestível.
Macrolepiota venenata – O “falso frade” venenoso facilmente confundido com a espécie Macrolepiota procera
[Fotografia: DR]
O consumo de cogumelos em várias regiões do país restringe-se, muitas vezes, à Macrolepiota procera.
Os seus apanhadores baseiam-se no princípio de que “é fácil a sua identificação, em particular pelas características do chapéu e pela existência de um anel”. Contudo, salientou Gravito Henriques ao Público, trata-se de uma atitude “precipitada”.
Sabe-se agora que recolhiam uma espécie, a Macrolepiota venenata, que tem várias semelhanças com a que consideravam inócua, e as consequências têm-se revelado por vezes dramáticas pois só recentemente foi identificada e ainda está pouco estudada, para além da informação produzida ser escassa e pouco divulgada.
As recomendações de quem sabe
Perante os casos de envenenamento por ingestão de cogumelos que habitualmente aumentam nesta altura do ano, os especialistas recomendam que os cogumelos devem ser colhidos já depois de terem atingido um certo grau de maturidade, para evitar possíveis confusões com espécies eventualmente venenosas.
São também unânimes no conselho de que não se devem apanhar cogumelos selvagens sem haver certeza absoluta da espécie a ser colhida e de que a mesma é própria para alimentação humana.
Quanto ao transporte, aconselham também, os cogumelos devem ser colocados em cestos ou similares para permitir o arejamento e evitar que se estraguem. Devem também ser evitadas quaisquer misturas de espécies. Um só exemplar venenoso pode contaminar todos os outros comestíveis, tanto na simples recolha e transporte, como, em especial, no momento da confecção.
Os especialistas deixam ainda o alerta de que a maior parte dos cogumelos potencialmente mortais revelam os sintomas de uma forma dilatada no tempo, entre 10 a 48 horas após a ingestão, quando todo o veneno (toxinas) já se encontra na circulação sanguínea.
Vómitos, diarreia, mal-estar geral, cãibras e suores frios são alguns dos sintomas. Por ironia do destino, aos primeiros sintomas segue-se habitualmente um período de remissão, com sinais de melhoras. “São umas falsas melhoras: é nessa altura que o fígado e os rins se deterioram”, avisam.
Como os sintomas só se manifestam horas após a ingestão e não há antídoto conhecido para o veneno dos cogumelos, o tratamento é apenas aos efeitos, não à causa. Nos Estados Unidos foram registados resultados positivos usando uma associação entre penicilina e silibinina, substância não reconhecido pelas autoridades médicas.
A ingestão dos cogumelos Amanitas Phalloides tem uma taxa de mortalidade entre os 10 por cento e os 60 por cento. No caso de colapso total do fígado ou dos rins, a única solução é o transplante daqueles órgãos.
Jornadas Micológicas de Paredes de Coura a caminho
No Alto Minho, um dos eventos de referência para saber mais sobre cogumelos são as Jornadas Micológicas de Paredes de Coura.
A Rádio Vale do Minho sabe já que a próxima edição deste evento, que será a 14ª, irá ocorrer “ou a 26 de novembro ou a 4 de dezembro”, de acordo com a organização que brevemente confirmará uma destas duas datas.
As jornadas terão lugar no Centro de Interpretação Ambiental (CEIA) de Paredes de Coura.
CEIA de Paredes de Coura volta este ano a ser palco das Jornadas Micológicas
[Fotografia: Arquivo/Cecília Pereira Grupo FB Terra Amada]
O programa ainda não foi divulgado mas, habitualmente, destaca-se por um passeio micológico na Paisagem Protegida do Corno de Bico e oficina de identificação e catalogação de espécies recolhidas no passeio micológico.
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